Para você que não é Amish



Existe um grupo de religiosos cristãos vivendo nos EUA e Canadá que tradicionalmente evitam o contato com o restante da sociedade. Eles, os amish, são um povo pacífico e simples que evita todo tipo de tecnologia e produzem tudo (ou quase tudo) que consomem para sobreviver. Além do mais, não prestam serviço militar, não pagam seguro social e não aceitam qualquer forma de assistência do governo.

Olhando assim de longe, vendo as fotos de uma família amish cuja fé, união e sustento do próprio grupo familiar dão o sentido de viver, veio-me uma ideia tão instantânea quanto fugaz: nesse nosso meio onde nos deparamos diariamente com a covardia e a pequenez humana, não seria nada mal viver como um deles, sempre em harmonia e alheios às desgraças cotidianas. Mas onde ficaria a criatividade, a curiosidade de experimentar outro tipo de vida, de buscar outros caminhos? É preciso lembrar que eles sempre se vestem da mesma forma; comem as mesmas coisas; não bebem (bebida alcoólica); não ouvem músicas; não usam eletricidade, além de outras restrições.

Como em qualquer grupo tradicional e conservador, as regras são sempre rígidas para os que ousam desrespeitá-las. Então, o que aconteceria se você, um jovem amish, começasse a se questionar: “mas o que realmente há por trás deste celeiro”? A tradição amish, para lidar com esta situação, oferece aos jovens uma espécie de liberdade provisória. É o chamado Rumspringa, período que começa aproximadamete aos dezesseis anos, quando eles são livres para vivenciar “o outro mundo”, e termina anos mais tarde com o duro momento da decisão definitiva, onde deverão aceitar o batismo e continuar amish ou deixar, para sempre, a comunidade. Então os ingênuos amish saem, conhecem a calça jeans e as roupas coloridas, o Iphone, as bebidas e cigarros, as festas, a TV, a geladeira, os carros; uma infinidade de possibilidades antes inimagináveis. Segundo a Cabala (filosofia esotérica judaica) a razão maior das nossas vidas é o de aprendermos a receber e compartilhar “a luz”. No entanto, devemos ir recebendo a luz aos poucos, do contrário corremos o risco de ficarmos cegos ou loucos. Numa comparação grosseira, creio que é o que acontece aos jovens amish ao receberem tamanha gama de informações, somando-se ao peso da dura escolha final. Sentindo-se atordoados, uma vez que nada daquilo lhe é familiar, a esmagadora maioria, aproximadamente 80%, voltam e optam pelo batismo definitivo. Junto à família, longe da “confusão” moderna, eles seguem com suas vidas pastorais e são felizes para sempre.

E quanto aos 20%, o que será que acontece? Assisti a um documentário exatamente sobre isso. Foi doloroso ver aqueles jovens de sotaque diferente e olhares desconfiados, tendo que decidir por um mundo fascinante e ao mesmo tempo estranho, pagando o preço de simplesmente serem banidos da convivência familiar. Seríamos capazes de imaginar o sofrimento deles? Um dos outsiders mais velhos, que acabou fundando uma espécie de república para abrigar os “ex-amish” e os apoiarem no novo cotidiano, mostrou como fazia para matar as saudades de casa. De vez em quando ele pegava seu carro, estacionava próximo à sua antiga casa, e observava, com carinho, a família que ele teve de deixar para trás. Já um “ex-amish” novinho, ainda completamente atordoado com a escolha que fizera, deu para falar muito mal de toda a comunidade. Aprendendo a dirigir, começou a perturbar os amish com música alta, gritando e xingando. Sua desorientação era tanta, que mais tarde fora indiciado por ter incendiado alguns veículos dos amish (carroças).

Se os amish não fossem forçados a uma escolha tão brusca e dramática, certamente essa transição seria fácil, positiva e proveitosa. Poderiam desbravar os quintais distantes, se alegrar, se decepcionar, se desenvolver ou fracassar por conta própria, movidos pela inerente curiosidade humana de descobrir sempre mais. E o melhor: voltar à antiga casa e ser recebido com alegria.

Seguir na segurança de uma tradição ou se arriscar por novos e desconhecidos caminhos? Com o conforto de sua casa e com o mundo inteiro te acenando, você, que não é amish, talvez se sinta aliviado por não precisar responder a este dilema. No entanto, pensando com um pouquinho mais de humildade, talvez você mude rápido de opinião e afirme admirado: - Sorte deles ter de enfrentar somente um Rumspringa!

Será?

Aqui, parte 1 do documentário sobre os amish outsiders
http://www.youtube.com/watch?v=PmYmJNsaT-E
 
Paródia sobre os amish
http://www.youtube.com/watch?v=H6YyWi4eQCI

Comentários

  1. Muitíssimo interessante! Não sabia que esse tipo de sociedade existia!

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  2. Gabi, achei coisa "de outro mundo" quando soube dos Amish. É realmente interessante. Assisti todo o documentário sobre os outsiders no You Tube. Vale muito a pena! Impressiona mesmo! abraço

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